Há seis meses atrás, no dia de hoje, o sol decidiu aparecer por entre as nuvens no céu da Irlanda. Há seis meses atrás, filmei aqueles que foram os últimos segundos que passei naquela pista de aeroporto que tantas e tantas vezes tratei por 'tu'. Passou meio ano desde então e, embora esta tenha sido ainda a última vez que tive todo aquele verde no meu horizonte, posso dizer que Dublin terá sempre um lugar especial no meu coração. Já estive em muitos sítios, vi muitas cidades novas desde então, mas Dublin será sempre o sítio onde embora o inverno seja mais longo, o verde também é mais verde, o outono é mais outono e o verão fica mais fácil. Dublin será sempre o sítio onde tudo começou. E uma parte de mim vai sempre estar lá. O nosso caminho somos nós que o escolhemos. E eu não me arrependo nem por um minuto de ter escolhido um caminho que me tenha levado até aquela cidade mais - tão - a norte. Hoje percebo, embora na altura não o soubesse, que muito do que sei e sou hoje, aprendi-o ali. O preço dos sonhos paguei-o alto ali. As mais pesadas lágrimas chorei-as ali. E Portugal nunca me soube tanto a casa como quando fui para ali. Andei na melhor escola de aviação. Saiu-me a ferros. Deitou-me ao chão várias vezes. Irritou-me. Desgastou-me. Levou-me ao limite e testou-o. Fez-me duvidar se o teria em mim várias vezes. Mas não saberia metade do que sei hoje se não tivesse passado por isso. Ainda hoje, tantos meses depois, me baseio em coisas que aprendi ali para tomar decisões. Por isso, quando me perguntam como foi trabalhar para aquela famosa companhia aérea azul e amarela da qual se ouve muito mal e pouco bem, a minha resposta é invariavelmente esta: se queres ficar nesta coisa da aviação durante algum tempo, então vai. Não vais encontrar melhor escola do que aquela. Melhor preparação mental para os desafios do dia a dia do que aquilo. Não vais descobri o quanto gostas disto enquanto não enfrentares o bicho mais difícil durante uns meses. Vai. Começa por baixo. Baixa a cabeça e aprende. Aprende tudo o que puderes. Observa muito. Absorve tudo. Deixa que a experiência te molde. E um dia, quando descobrires que o tens em ti, levanta a cabeça e sai. Porque tu mereces melhor, mas em algum momento, aquilo foi o tudo o que tu precisavas. O caminho faz-se caminhando. Não queiras tudo duma vez. Eu não me arrependo nem por um minuto dos caminhos que me levaram uma vez até Dublin.
Há seis meses atrás, no dia de hoje, o sol decidiu aparecer por entre as nuvens no céu da Irlanda, e enquanto o avião cruzava aquelas nuvens e o sol batia mais forte na minha janela, eu soube: dificilmente algo me mudaria tanto como aquele ano que tinha passado. E por isso, quando a lágrima teimosa que eu estava havia horas a tentar prender, finalmente caiu, eu deixei-a cair, enquanto olhava uma última vez para a vista mais verde de sempre. E, ao contrário de muitas outras lágrimas que me caíram ali, grandes e dolorosas, aquela foi de alegria. Por me ter tornado na pessoa que queria ser.