25.1.14

Falou e disse

« fui convidada para o evento chamado praxe não é tortura. é para rir ou ir vomitar ali ao cantinho? a sério pessoas, estas manifestações públicas em grupo da vossa opinião pessoal, só vos infantilizam. querem expressar a vossa opinião, expressem, não organizem iniciativas ocas destas em grupinho, com argumentos ainda mais vazios, que não acrescem nada de novo ao mundo. a praxe é como tudo o que envolve hierarquias e poder, há pessoas que sabem usufruir do seu cargo de chefia, no que confere a responsabilidades, e os que hão-de sempre afirmar-se pelo poder, e o que é isso do poder? socialmente, o poder desta era ou está no dinheiro ou na posição social. não preciso de referir o poder pelo medo de represálias físicas, certo? já o conhecemos doutros séculos. por isso é assim, se querem ver o poder mal exercido, no que confere à força física, vejam os moços da casa dos segredos a comparar pernas, braços e barrigas ao espelho, grandes animais, ninguém se mete com eles, o mais forte será sempre o de maior tamanho. é uma imposição primitiva, reparem, há uns quantos casais onde o amor funciona assim, ela ama-o ou teme-o, tanto faz, o amor e o temor fundiram-se. se querem ver o poder do dinheiro mal gerido, vejam o assédio que habita nas chefia de grandes ou pequenas empresas e as horas de trabalho que são feitas na china por uma bagatela de dinheiro. se querem ver o estatuto a afectar o poder, pensem que os bullies costumam ser populares, e os mauzões admirados pelas miúdas. há reforços sociais por todo o lado. tendemos a ser submissos perante figuras de autoridade, e muitas vezes, esses indivíduos afirmam-se com uma farda. há por aí muito polícia e segurança a usufruir desumanamente do seu estatuto. não é novidade nenhuma. os juízes muitas vezes trazem os preconceitos e juízos de valor pessoal para o tribunal e a praxe é só mais um caso infeliz de usurpação de poder. ou vão-me dizer que nunca viram ninguém praxar ali a tombar para o ego enaltecido do poder? eu já. não posso dizer que a minha experiência com a praxe tenha sido negativa, mas em parte isso deveu-se, a não me ter submetido à maioria das praxes. e por sorte ou azar, na faculdade onde entrei primeiro, o dux e os veteranos eram bajulados e temidos ao extremo. e eu achei aquilo tudo um fenómeno para lá de interessante. não preciso de dizer, que fui tolerada por eles, e eles tolerados por mim. a praxe foi para mim um período de tolerantismo. sempre tive o compromisso para comigo de ser praxada para ver como era e até achar que chegava daquilo. a praxe era algo que queria observar com os meus olhos, só isso. não precisei da praxe para me conhecer, ou conhecer amigos, isso é uma parvoíce. conhecia-me o suficientemente bem para saber que não iria a todas as praxes, que só conseguia lidar com pessoas a falar éne decibéis acima da minha cabeça por um período de tempo, e que bom, nojentices típicas não são o meu tipo de humor para que possa delas desfrutar. quando digo que fui tolerada, significa que era daquelas que eles não gostavam nada. não gritava, dirigia-me a eles para fazer comunicados e não pedidos e não me ria de coisas que todos pareciam achar engraçadíssimas. em verdade, sabotava a maioria das praxes que eles idealizavam. não de uma forma grupal, mas de uma forma individual. primeiro, só almocei uma vez com eles, porque estava num dia mau e não me apeteceu entrar mais uma vez no filme de anunciar que não prezava a companhia deles para as refeições e consecutiva discussão. comi pão e bebi água, e disse que até existir uma guerra ou pobreza extrema, não me ia sujeitar ao hábito primitivo, de comer sem talheres. claro que se gerou ali o circo, comeram perto de mim, ao melhor estilo, vamos torturar esta miúda cheia de fome. deixei aquilo rolar, e dez minutos depois disse, assim armada em mete-nojo, não gosto dessa comida, além do mais uma vez numa cantina, encontrei larvas na salada, se olharmos em volta, isto tem tanto lixo que nem deveria servir comida, mas enfim, fazer o quê? ao menos o pão vem embalado, livre da restante nojeira. talvez tenha começado com o pé esquerdo, quando saí de uma praxe no maior à vontade com a minha camisola laranja, esperei que o sinal ficasse verde e me dirigi ao edifício para ter aulas, sem que ninguém notasse. vindo a correr bisontes, abelhas e doutores em estado alerta atrás de mim, dois minutos depois. aos quais eu simpaticamente disse que agradecia a atenção mas que agora ia ter aulas, ameaças e impropérios depois, disse que mantinha a minha decisão de abandonar a praxe por aquele dia. tenho um limite para berros na minha cabeça. ameaças e impropérios depois, salientei que estava a ficar atrasada. ameaças e impropérios depois, disse num tom cortante, que ou me paravam de aborrecer ou eu declarava-me antipraxe, que já estavam a ficar demasiado histéricos e eu não tenho pachorra para pessoas desesperadas. ameaças e impropérios depois, disseram-me que para ser antipraxe tinha de assinar um papel, não sei onde. agradeci a informação, mas tinha aula agora. e perguntei onde era aquela sala, assim de horário em punho. já não houve mais impropérios nem ameaças, disseram-me a sala, e disseram para pensar melhor se eu queria assinar o papel antipraxe. e eu disse que não tinha assinado nenhum papel a favor da praxe para assinar um contra. a partir desse dia, foi sempre a cortar. na minha faculdade actual, a maioria das praxes são divertidas, não existe veneração a doutores e coisas tais. já vi algumas praxes abusivas por parte de outros cursos, mas também acho que quem se submete às mesmas, é porque consente ou não-está informado, e bom a informação procura-se, se não se procura é porque a ignorância é valorizada. também já assisti a algumas divertidas e colaborei com a tarefa imposta ao caloiro. não sou nem contra, nem a favor da praxe. acho sim, que cada um tem a praxe que acha que merece. a minha consistiu em meia dúzia de dias salteados, três madrinhas a quem eu não ligo puto e um traje que a cada ano vesti menos, e muitas vezes de unhas pintadas. as pessoas de quem gostei mais, conheci-as fora da praxe. e nunca tive intenção de praxar, e aqui estou eu no quinto ano, sem ter praxado. digamos que a imagem de vestir o traje, andar a caçar caloiros como se estivéssemos num jogo do super mário e mandar uns berros, a mim, é pouco apelativa. assim de repente, consigo pensar em coisas mais divertidas para se fazer. agora o que mais me chateia, não é as pessoas praxarem, nem não praxarem, nem serem praxadas ou não praxadas. não é pertencerem a uma comissão de praxe, esse órgão tão poucachinho. é só este falatório todo, em grito de massa. e iniciativas parolas, parolas, parolas. já estou como a outra, as saudades do verão são a desculpa para pôr fotos em biquini, e a polémica da praxe para pôr fotos de doutor ou de caras lambuzadas. »

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